Há alguns anos, estávamos trabalhando para entender a dinâmica de aprendizagem dos profissionais de mais alto desempenho de um de nossos clientes, uma grande empresa do setor elétrico. “Aqui, um engenheiro, por mais qualificado que seja, leva 5 ou 6 anos pra ficar bom, bom mesmo”, comentava um gestor sênior de área técnica. “Quem tem mais tempo de casa tem melhores resultados?”, perguntei. A resposta foi categórica: “Nunca vi um engenheiro entrar na empresa e em 3 ou 4 anos atingir o mesmo nível dos colegas com mais tempo de casa, mesmo já tendo experiência sólida em outras empresas. Nosso negócio é muito particular e esse tempo de maturação é determinante para o desempenho”.
Eu então brinquei, perguntando se bastava ser contratado e sentar atrás de uma mesa durante 6 anos para atingir o máximo desempenho, ao que ele explicou “não, claro, é que nesses 5 ou 6 anos o colaborador passa por muita coisa, acompanha projetos do início ao fim, vê muita coisa acontecer”. E esse aprendizado de alguma forma é incorporado pela empresa ou compartilhado com outros profissionais? Ele pensou por alguns segundos e balançou a cabeça negativamente: “não, o aprendizado depende da atitude do colaborador e fica tudo na cabeça de cada um”.
“O aprendizado depende da atitude do colaborador
e fica tudo na cabeça de cada um”
Essa breve conversa nos traz duas constatações muito significativas:
- Cada negócio tem seus próprios ciclos, e os aprendizados mais importantes estão associados a esses ciclos; e
- Parte desse aprendizado de alguma forma é capturado pelos indivíduos, mas raramente é aproveitado pelas empresas e organizações para ampliação dos resultados e evolução do negócio.
Por que isso acontece? Por que os conhecimentos mais importantes exigem tempo – mais precisamente, só emergem à medida que se completam determinados ciclos – mas mesmo assim ficam somente “na cabeça” das pessoas, sendo pouco ou nada aproveitados pelas empresas e organizações? E como sair da inércia e aproveitar esse conhecimento para impulsionar os resultados do negócio?
Tudo indica que isso se deve em grande parte ao fato de muitas organizações (e mesmo as pessoas) se preocuparem com o “foco em resultados”, mas não com capitalizar o conhecimento, subproduto intangível porém altamente valioso, que pode ser extraído desses resultados.
Conhecimento gera resultados, e vice-versa
Muitas organizações se dizem “orientadas a resultados”. Toda a lógica de atuação dessas organizações é construída em função dos resultados buscados. Isso se traduz normalmente em um ciclo de atuação que pode ser representado como INTENÇÃO > AÇÃO > RESULTADO (ou planejamento > execução > resultado).
Uma indústria de bens de consumo, por exemplo, que seja realmente orientada a resultados, terá indicadores claros e uma cultura de gestão que valoriza a definição e a busca por resultados objetivos. Como a maioria das organizações, essa empresa aplica seus melhores conhecimentos e esforços nos processos produtivos para atingir volume, qualidade e prazo adequados. Mas, também como a maioria das organizações, uma vez atingidas as metas as equipes partem em busca de novos resultados (iniciam novos ciclos) sem se preocupar com o aprendizado a partir dos resultados obtidos.
O foco restrito em resultados tem sido um dos
maiores limitadores da evolução das organizações
O mesmo acontece em empresas de outros setores, como o de software: métodos ágeis são aplicados para o desenvolvimento e implantação de soluções, diversos esforços e ferramentas apoiam relacionamento, vendas, suporte, e assim por diante. Como todo o foco está no “produto” e seus resultados, uma vez concluídas as entregas as equipes partem imediatamente para novos projetos, novas metas, sem buscar extrair o conhecimento que pode estar “embutido” nos resultados gerados.
INTENÇÃO > AÇÃO > RESULTADO > NOVO CICLO
Esse ciclo é repetido automaticamente, e com isso deixamos de aproveitar o “outo lado” dos resultados: eles são uma das maiores fontes para a aprendizagem, para a geração de conhecimentos reaplicáveis pela empresa.
Nada contra a organização ser orientada a resultados, exceto por essa grande oportunidade perdida: o aprendizado embutido em cada ciclo do negócio tem enorme potencial de impulsionar tanto o desenvolvimento dos colaboradores quanto os processos organizacionais, e até mesmo contribuir para o aprimoramento da estratégia do negócio. O conhecimento que pode ser extraído com a interpretação (ou “sensemaking”) dos resultados pode ser aproveitado para aprimorar o desempenho dos próximos ciclos do negócio.
O aproveitamento desse conhecimento “oculto” se traduziria em um ciclo diferente: INTENÇÃO > AÇÃO > RESULTADO > CONHECIMENTO.
INTENÇÃO > AÇÃO > RESULTADO > CONHECIMENTO > NOVO CICLO
À primeira vista essa mudança de abordagem pode parecer um luxo supérfluo, mas não se considerarmos que o conhecimento é um dos ativos que mais contribuem diretamente para resultados superiores. O ciclo INTENÇÃO > AÇÃO > RESULTADO > CONHECIMENTO permite ir além de auferir resultados diretos do negócio (receita, lucro, reputação, benefícios à sociedade, entre outros) para também auferir um subproduto adicional altamente valioso: capital intelectual, conhecimento reaplicável.
O foco restrito em resultados tem sido um dos maiores limitadores da evolução das organizações. Traduzindo uma realidade mais complexa em termos simples: colocamos todos os nossos esforços e recursos na geração de resultados diretos do negócio, focamos nas entregas dos processos e nos impactos que elas geram, e assim que as entregas ou resultados aparecem partimos para o próximo ciclo de entregas e resultados. Agindo assim, deixamos escapar o conhecimento gerado nesse processo e em ciclos paralelos que acontecem no negócio.
Os ciclos de gestação do conhecimento
Aproveitar os “subprodutos” na forma de conhecimento – e assim impulsionar ainda mais os resultados e a evolução da organização – envolve identificar os ciclos que acontecem por trás, em paralelo e além da geração de resultados diretos. Ou seja, exige ir além do foco em resultados e buscar ativamente os potenciais aprendizados que eles podem gerar.
São três os principais ciclos que sua organização deve enfocar para ampliar o potencial de resultados: o ciclo estratégico, o ciclo dos projetos e processos, e o ciclo das pessoas.
Em cada um desses ciclos são gerados os resultados que compõem o desempenho da organização. Na gestão orientada a resultados, a organização se concentra nos produtos e resultados gerados por essas atividades que compõem seu desempenho. Na gestão orientada a resultados e aos ciclos de conhecimento, cada um desses ciclos traz oportunidades valiosas de geração de conhecimentos reaplicáveis capazes de aprimorar os resultados futuros.
Ciclo Estratégico do Negócio
Todo negócio tem um ciclo estratégico: um período e sequência de atividades que começa com o planejamento estratégico, passa pela execução da estratégia e culmina com a medição dos resultados atingidos naquele ciclo. Pode ser considerado como um ciclo de conhecimento de médio ou longo prazo, dependendo do quão dinâmico ou estável é o setor e do próprio horizonte de tempo contemplado na estratégia da empresa, que pode ser de um ou vários anos.
O ciclo estratégico merece toda a atenção em termos de aprendizagem organizacional:
- A estratégia foi elaborada com base em um ou mais cenários. Esse cenário se confirmou?
- Parte importante da estratégia é a definição de objetivos a serem atingidos e as iniciativas a serem realizadas para atingi-los no período planejado. Os objetivos foram atingidos?
- Os resultados, positivos ou negativos, foram atingidos por meio de iniciativas e práticas de gestão. Como as iniciativas e processos executados contribuíram para os resultados?
- O que aprendemos olhando para esse ciclo? Que conhecimentos podemos extrair da correlação entre cenário projetado, objetivos definidos, ações realizadas e os resultados obtidos? Que significado podemos gerar a partir da análise (sensemaking) desse processo?
A organização pode aprender muito apenas promovendo essa reflexão de forma consciente e estruturada, extrair conhecimento dessa reflexão e reaplicar o aprendizado nos próximos ciclos estratégicos.
Quanto mais a empresa exercita esse tipo de aprendizado, mais “aprende a aprender” – ou seja, desenvolve a capacidade de capturar e reaplicar conhecimentos a partir dos resultados gerados com o planejamento e execução da estratégia.
Ciclo de Projetos e Processos
A mesma lógica aplicada para gerar aprendizagem organizacional a partir do ciclo estratégico do negócio pode ser usada para gerar conhecimentos reaplicáveis no contexto de processos organizacionais ou projetos específicos.
Existe um ciclo que começa no início do desenho de um projeto ou de um processo (ou mesmo antes, no diagnóstico que motivou seu desenho), passa por seu desenvolvimento e execução, e vai até a geração de resultados. Este geralmente é um ciclo de conhecimentos de curto ou médio prazo, dado que a maioria dos processos ou projetos é realizado num horizonte de tempo mais curto que o ciclo do negócio, por exemplo.
Do diagnóstico aos resultados, muita coisa acontece: decisões, dúvidas, estudos e discussões, ações, desvios, descobertas, acertos, erros, aprendizado em nível individual. Esse ciclo – novos projetos ou processos – pode começar novamente do zero, desperdiçando o potencial de aprendizado, ou pode ser retroalimentado com a captura e disseminação do conhecimento gerado ao longo do projeto (ou processo), em formatos que possibilitem sua reaplicação em outros projetos (ou processos).
Uma vez que a organização percebe o potencial de reaplicação de conhecimentos que estão sendo gerados, o aprendizado também pode ser reaplicado em outras fases do mesmo projeto/processo, ou mesmo gerar transformações na estratégia e modelo de atuação da empresa.
Ciclo de Pessoas
Além dos ciclos estratégicos do negócio e dos ciclos de processos e projetos – que permitem a geração de conhecimento a partir da correlação intenção-ação-resultados –, existe um terceiro ciclo que acontece nas organizações em paralelo aos demais ciclos citados e que proporciona alto potencial de aprendizado. Trata-se do ciclo de pessoas, um ciclo que pode ser tanto de curto quanto de longo prazo.
Pessoas são contratadas e desligadas das empresas o tempo todo, e seu ciclo de colaboração (e de amadurecimento profissional) pode durar semanas, meses ou muitos anos. Como no diálogo citado no início deste texto. Ao longo desse ciclo, cada pessoa assume papéis distintos e passa por experiências e vivências distintas, gerando resultados nesse processo.
Ao vivenciar desafios, projetos, processos, ocorrências, ciclos estratégicos inteiros ou mesmo grandes transformações organizacionais e verem resultados associados a esse esforço, as pessoas acumulam aprendizado. Porém na esmagadora maioria dos casos esse conhecimento fica limitado ao nível individual, ao campo de atuação e ao tempo de dedicação daquele indivíduo. Até que ele deixa a empresa e o conhecimento desenvolvido deixa de gerar valor naquela organização.
Ciclos menores podem ser identificados no ciclo de pessoas, seja no nível de projetos e processos, seja na forma de transições de carreira. Portanto a captura de capital intelectual a partir dos aprendizados pode ser realizada à medida que a pessoa assume novos projetos ou desafios, que atinge determinados marcos de carreira e que sua trajetória toma novos rumos, abrindo novos ciclos de aprendizagem individual com potencial reaplicação em outros contextos do negócio.
Gerando conhecimento a partir dos ciclos do negócio
Qualquer organização pode ampliar seu foco de atuação para aproveitar o conhecimento gerado em seus ciclos estratégico, de projetos e processos ou de pessoas. Isso não significa deixar de lado a busca por resultados – que continua sendo a essência de qualquer negócio – mas sim ir além dessa busca por resultados diretos, colhendo os resultados indiretos associados ao capital intelectual. Esse capital pode ser reaplicado no contexto do negócio para gerar mais e melhores resultados. Podemos dizer que todo negócio gera resultados (financeiros ou de outra natureza) e conhecimento, mas poucas organizações estão preparadas para capturar conhecimento, transformá-lo em capital intelectual e reinvesti-lo no negócio.
Essa captura e reinvestimento se dá por meio da gestão do conhecimento (GC). Nem toda gestão do conhecimento está orientada aos ciclos do negócio (frequentemente a GC é estruturada para contribuir de forma mais pontual), mas a abordagem por ciclos oferece maior potencial de retorno pois lida com aprendizados a partir de resultados concretos e diretamente associados à prática do negócio.
Antes de definir a estratégia de gestão do conhecimento para cada ciclo, é importante notar que esses ciclos podem variar em alcance e duração de setor para setor, e mesmo de organização para organização. Setores dinâmicos, em que os ciclos são rápidos e os desafios mudam constantemente, exigem abordagem diferente da usada em setores mais estáveis, em que os resultados se apresentam em períodos mais longos e os paradigmas demoram mais a serem alterados. Cada organização deve buscar entender seus ciclos para poder aprender com eles e aproveitar o potencial do conhecimento gerado em cada um deles.
Conhecimento gera resultados, e vice-versa
Uma vez entendidos os ciclos do negócio, existem várias possíveis abordagens para a gestão do conhecimento nesse contexto. Em nossa atuação como consultoria, a abordagem que adotamos e aprimoramos ao longo de dezenas de projetos com organizações dos mais variados setores, tanto no Brasil quanto em outros países, envolve um processo de gestão em quatro grandes fases: captura, mobilização, aplicação e criação de conhecimentos.
O gráfico a seguir exemplifica como esse fluxo de conhecimentos se aplica em cada um dos ciclos do negócio.
Cada um desses ciclos representa uma enorme oportunidade para empresas e organizações identificarem conhecimentos relevantes, que podem ser transformados em capital intelectual a serviço da geração de resultados e da evolução do negócio. Uma vez analisadas as características desses ciclos em cada negócio e em cada organização, é possível definir práticas e ferramentas de gestão do conhecimento adequadas a cada contexto específico. Essas práticas – estruturadas como um processo ou capacidade organizacional – devem concretizar a captura do conhecimento gerado ao longo de cada ciclo e promover a mobilização desse conhecimento para a aplicação em novos contextos do negócio ou na estratégia organizacional.
A gestão orientada a resultados, quando bem aplicada, é capaz de levar a resultados superiores. A gestão orientada a resultados e conhecimentos, aplicando a gestão do conhecimento de forma inteligente aos ciclos do negócio, é capaz de ampliar os resultados de cada ciclo e de impulsionar a efetiva evolução do negócio e da organização.
Quer conhecer mais sobre os serviços da Impakt em gestão do conhecimento? Clique aqui